PL 2630: um panorama após semana decisiva
A semana passada serviu para mostrar que, apesar de não ter sido votado o PL 2.630/20, a pauta de regulação de plataformas segue quente em Brasília. Na última semana foi a vez do Telegram, que já foi destaque de tensões com o governo e o judiciário brasileiro nos últimos anos. A plataforma disparou para seus usuários uma mensagem com fortes ataques ao PL 2.630/2020. A conduta resultou em providências tomadas por diversos órgãos e somente após determinação de suspensão do aplicativo, a empresa retirou a mensagem.
Por outro lado, o parlamento continua se movimentando internamente para adaptações no texto em busca de sua aprovação. Algumas alterações têm sido cogitadas pelas lideranças e a Anatel continua na disputa para ser o órgão regulador. A agência tem circulado, principalmente pelo Congresso Nacional, informações para convencimento de seu potencial e um desenho de uma nova área.
Ainda sobre regulação, a Frente da Radiodifusão, reinstalada na Câmara, terá como prioridade a igualdade de exigências legais para emissoras de rádio, televisão e meios digitais.
Outra base de apoio para o tema é o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), que divulgou nota em defesa dos pontos de responsabilização estabelecidos no atual texto do projeto.
No âmbito da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), foi firmado um acordo de cooperação da entidade com o Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF) para estimular a Inteligência Artificial (IA) no setor.
Por falar em dados, a concessionária que presta serviços para o Metrô de São Paulo, teve sua condenação mantida após ser confirmado o uso ilegal de imagens capturas pelo sistema de câmeras de segurança.
Telegram dispara ofensiva contra o PL de regulação das plataformas
Na última terça-feira, 9, o Telegram enviou uma mensagem para usuários da plataforma com ataques ao PL 2.630/2020. A mensagem apontou o projeto como uma legislação perigosa e que acabaria com a liberdade de expressão. Além disso, a empresa buscou intimidar afirmando que "empresas como o Telegram” deixarão de prestar serviços ao Brasil se o projeto for aprovado. A mensagem também faz menção ao Google e a Meta, que afirmaram, por meio de nota, não terem dado autorização para uso de seus nomes.
Após o ocorrido, o relator do projeto, deputado Orlando Silva (PCdoB/SP), se pronunciou no Plenário da Câmara, no qual afirmou que a empresa “abusa de sua estrutura de serviço de mensagem” e defendeu uma ação judicial contra o Telegram. Além disso, Silva lembrou que a plataforma, por falta de interesse, nunca participou dos debates sobre o tema.
Assim como no caso do Google, tratado aqui na última Descodificado, a conduta do aplicativo gerou consequências. A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) abriu um procedimento de averiguação preliminar e notificou a plataforma. O órgão listou algumas infrações que podem ter sido cometidas com a mensagem disparada, como violação dos próprios termos de uso da empresa e utilização de dados pessoais dos consumidores para fins não previstos e que vão contra a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Ainda no âmbito consumerista, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) enviou um pedido à Senacon requerendo a inclusão do Telegram na medida cautelar feita ao Google, que proíbe a produção de propaganda contrária ao projeto.
O Ministério Público Federal (MPF), assim como no caso Google, instaurou inquérito civil para apurar a conduta abusiva da empresa e considerou que o conteúdo violou o Marco Civil da Internet e o Código de Defesa do Consumidor. O questionamento do órgão é acerca do motivo da mensagem ter sido encaminhada, aparentemente, a todos os usuários da plataforma, e não somente aos inscritos no canal da empresa no aplicativo.
A Procuradoria-Geral da República, a pedido do presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP/AL), solicitou ao Supremo Tribunal Federal (STF), uma investigação contra os diretores do Google e Telegram. De acordo com o presidente, os representantes buscam preservar seus direitos econômicos e, para isso, aproveitam-se de sua posição hegemônica no mercado para uma campanha desinformativa e de manipulação e intimidação.
Por fim, o Judiciário também adotou providências no âmbito do inquérito das fake news. O ministro Alexandre de Moraes, do STF, na última quarta, 10, determinou a suspensão do Telegram por 72h se o conteúdo não fosse excluído em 1 hora. Moraes também determinou que o aplicativo envie uma nova mensagem afirmando o caráter ilícito e desinformativo da mensagem anteriormente disparada. Na decisão, o ministro argumentou que a empresa é reincidente em práticas que “permitem a proliferação criminosa de mensagens fraudulentas” e destacou a necessidade das condutas serem investigadas, uma vez que são remuneradas por impulsionamentos e monetização.
A decisão foi devidamente cumprida pela empresa que retirou os ataques e disparou nova mensagem estabelecida pela Corte. Independente da exclusão, os responsáveis deverão ser ouvidos pela Polícia Federal, conforme determinado na decisão de Moraes.
Articulações em torno do PL 2.630/2020
Apesar do adiamento da votação de mérito do PL 2.630/2020 sem data definida, as articulações em torno do texto seguem ocorrendo.
As mudanças mais recentes que têm sido trabalhadas são os dispositivos sobre direitos autorais e remuneração de jornalismo.
Ao que tudo indica, a modificação na Lei dos Direitos Autorais existente no texto atual, será destacada e debatida em uma outra proposta específica, apresentada em 2019, pela Dep. Jandira Feghali (PCdoB/RJ). Sobre esta última proposta, foi apresentado um requerimento de urgência no início do mês, mas a votação foi adiada na última semana devido a ausência do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP/AL). No que tange ao dispositivo da remuneração jornalística, ainda há indefinição quanto a sua retirada.
No sábado, 6, o relator da proposta de regulação de plataformas esteve presente em um painel sobre o tema em evento de jornalismo, realizado pela Associação de Jornalismo Digital (Ajor). Ao ser questionado sobre o assunto, o relator confirmou a possibilidade de retirada e que está dialogando com líderes.
O objetivo dos temas serem apartados é possibilitar a adesão de votos por aqueles que são contrários aos dispositivos. Silva ainda afirmou que o foco da proposta é a responsabilização das plataformas, mas que muitos temas secundários acabaram sendo incorporados ao debate.
Sobre o órgão regulador, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) tem circulado uma apresentação para convencimento de parlamentares e pessoas do setor pela escolha da agência como reguladora das plataformas. Entre os argumentos, há menção a criação de uma “superintendência de serviços e direitos digitais” dentro da agência para lidar com o tema. Em entrevista, o presidente do órgão, Carlos Baigorri, afirmou não haver conflito de interesse na fiscalização e mencionou sobre uma possível ampliação do conselho consultivo já existente no órgão, para incluir o Judiciário, jornalistas, plataformas e demais agentes envolvidos no tema. No entanto, há inúmeras oposições à agência, principalmente pela sociedade civil, como explicitado em nota pela Coalizão Direitos na Rede, que considera a Anatel inapta para a função.
Frente da Radiodifusão defende aprovação de regulação de plataformas
Foi reinstalada na última quinta, 11, na Câmara dos Deputados, a Frente Parlamentar Mista em Defesa da Radiodifusão, que terá o deputado Cezinha de Madureira (PSD/SP) como coordenador. O deputado afirmou, em discurso, que o estabelecimento das mesmas obrigações legais para emissoras de rádio e televisão e para os meios digitais será prioridade. Para que isso seja possível, Madureira explicou a importância de aprovação do PL 2.630/20, tendo em vista que a Lei da Radiodifusão é de 1962 e, portanto, incompatível com o cenário digital.
CGI.br divulga nota em defesa da flexibilização da responsabilidade das plataformas
Ainda sobre o assunto, o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) soltou uma nota pela defesa da responsabilidade solidária dos provedores de redes sociais, prevista na atual redação do PL 2.630/2020. De acordo com o Comitê, as empresas não são intermediárias neutras e devem ter responsabilidade em casos que gerem danos a direitos fundamentais, ao Estado Democrático de Direito e à soberania nacional. Além disso, o CGI.br também se manifestou de acordo com o mecanismo de protocolo de segurança, também previsto no texto e considerou “relevante as previsões estabelecidas para este Comitê”.
ANPD firma parceria com foco em Inteligência Artificial
A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) formalizou um acordo de cooperação técnica com o Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF) para elaboração de um instrumento regulatório experimental que incentive a Inteligência Artificial (IA) na Autoridade. Para isso, será adotado um programa piloto de sandbox em proteção de dados e IA, que proporcionará um ambiente controlado para testar as tecnologias no que tange a conformidade com as normas de proteção de dados pessoais. O programa servirá como fonte de insumos para elaboração dos regulamentos pela ANPD.
Justiça mantém condenação de concessionária por uso indevido de imagens de cidadãos
Em ação movida pelo Idec contra a concessionária ViaQuatro, do metrô de São Paulo, foi mantida a condenação da empresa por uso indevido do sistema de câmeras de segurança. A ação buscava impedir o uso de qualquer forma de identificação dos passageiros e, de acordo com o Judiciário, as imagens captadas dos usuários do transporte público foram utilizadas para fins publicitários e comerciais. Além de manter a condenação, o tribunal competente aumentou o valor do dano moral coletivo.
Ataque à moderação de conteúdo. O PL 2501/2023, apresentado por parlamentares da oposição contrários à regulação da plataforma, quer tornar crime as condutas de quem determina a retirada de publicações e conteúdos desinformativos disfarçados de manifestações políticas nos meios digitais ou físicos. O projeto também busca criminalizar quem determina a suspensão de atividades de plataformas digitais em virtude dos mesmos conteúdos. A proposta é uma resposta às recentes decisões do Ministro Alexandre de Moraes que determinou bloqueios de aplicativos em meio ao debate do PL 2.630/20. (Dep. Gilson Marques - NOVO/SC, Luiz Philippe de Orleans E Bragança - PL/SP, Coronel Meira - PL/PE e outros)
IA. O PL 2421/2023 autoriza o Poder Público a criar um fundo para redistribuição de renda para trabalhadores que tiverem atividades produtivas precarizadas devido ao avanço da inteligência artificial (IA) no mercado de trabalho. (Dep. Camila Jara - PT/MS)
LGPD. O PL 2532/2023 altera a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) para criar a obrigatoriedade aos provedores de serviços de aplicações de Internet de adotar medidas preventivas para coibir a divulgação não autorizada de conteúdo íntimo. (Dep. Laura Carneiro - PSD/RJ)
Estupro virtual. O PL 2534/2023 cria o crime de estupro virtual, com a mesma pena prevista para o crime de estupro. (Dep. Laura Carneiro - PSD/RJ)
Ativos virtuais. O PL 2451/2023 altera a lei que dispõe sobre a prestação de ativos virtuais para acrescentar competência ao órgão regulador. (Sen. Marcos do Val - PODEMOS/ES)
Senado Federal
Comissão de Segurança Pública
16/05/2023 | Pauta:
PL 2891/2020: Altera a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), para permitir a infiltração de agentes de polícia na Internet com o fim de investigar os crimes previstos nos arts. 216-B (registro não autorizado da intimidade sexual) e 218-C (divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia) do Código Penal.
Supremo Tribunal Federal
16/05/2023 |Pauta:
RE 1057258: Dever de empresa hospedeira de sítio na internet de fiscalizar o conteúdo publicado e retirá-lo do ar quando considerado ofensivo, sem intervenção do Judiciário.
RE 1037396: Discussão sobre a constitucionalidade do art. 19 da Lei n. 12.965/2014 (Marco Civil da Internet) que determina a necessidade de prévia e específica ordem judicial de exclusão de conteúdo para a responsabilização civil de provedor de internet, websites e gestores de aplicativos de redes sociais por danos decorrentes de atos ilícitos praticados por terceiros.